MÁRCIA
- Se meu pau fosse maior, você mudaria de ideia?
- Ah, Douglas, pelo amor de Deus...
- Tipo uns dois centímetros a mais, com umas veias mais pulsantes...
- Douglas!
- Porque se você disser que é isso, eu ponho uma prótese e...
- Douglas, isso não tem nada a ver com seu pau.
- Tem certeza?
- Tenho.
- Então por que tá me deixando?
- Não sei.
- Como não sabe? Uma decisão drástica dessas tem que ter, no mínimo, um bom motivo. Afinal, você está alterando irremediavelmente o curso futuro da nossa existência.
- Não exagera. Também não é pra isso tudo.
- Desculpe, mas é um choque muito grande pra mim.
- Ah, dá um tempo. Vai dizer que é a primeira vez que você é abandonado por uma namorada?
- Por uma namorada imaginária é a primeira vez sim. A gente cria uma namorada imaginária justamente para não ter esse tipo de problema. Sabe, eu criei você. Em tese, você não deveria sair do meu controle. Isso não devia estar acontecendo.
- Mas isso não está acontecendo. Na verdade, essa é uma conversa imaginária, uma representação alegórica, uma metáfora psíquica da sua virilidade frágil, da sua incapacidade para lidar com o sexo feminino, da sua impotência sexual latente e...
- Tá bom, tá bom. Eu não quis dizer acontecer no sentido literal. Quer dizer, eu achei que estivesse tudo bem com a gente e, de repente, você chega e diz que está tudo acabado. O que eu fiz de errado?
- Sei lá, nada. Acho que vivemos em mundos muito diferentes.
- Do que você está falando? Nós vivemos juntos na mesma casa.
- Você sabe do que eu estou falando. Eu nem conheço seus pais. E olha que eles também moram aqui.
- Márcia, você é minha namorada imaginária. O que acha que meus pais diriam se eu entrasse pela porta, apontasse um ponto vazio no espaço e dissesse: “oi, pessoal, essa é a Márcia, minha nova namorada”?
- Sempre a mesma desculpa. Você me trata como uma amante secreta.
- E o que você queria que eu fizesse?
- Queria que você não me visse apenas como um objeto. Queria que me desse mais espaço na sua vida.
- Mas, Márcia, você é minha vida.
- Douglas, a única coisa que eu preciso pra viver é de um pouco da sua capacidade de abstração e, como sua namorada imaginária, posso dizer com autoridade que você tem andado totalmente sem criatividade.
- Não acredito que estou ouvindo isso. Márcia, eu sempre fiz tudo pra te deixar feliz. Você queria restaurante francês, eu imaginei, queria casaco de vison, eu imaginei...
- Imaginou na cor errada.
-... queria um pônei, eu imaginei... Até aquela coisa estranha que você queria fazer... sabe, aquele lance com o melão...
- Hi, hi. Achei que você não ia topar. Deve ter doído bastante.
- Márcia, você tem tudo que toda mulher sempre sonhou. Você tem conforto, carinho, sexo de qualidade...
- Aham.
- O que foi? Olha, eu tive um probleminha ontem, mas foi a primeira vez e...
- Aham.
- Tudo bem, aquilo que aconteceu ontem vem acontecendo frequentemente. Mas é apenas uma fase.
- Aham.
- Ok, ok. Já entendi. Tenho andado um pouco... ahn... distraído. Mas você deveria concordar comigo que a grande vantagem da namorada imaginária é que a gente pode ter esses problemas sem que ela se estresse ou tenha vontade de procurar outro, ou... opa, opa. Peraí. Já entendi tudo.
- Entendeu o quê?
- Você tem outro.
- Não seja ridículo.
- Você tem outro. Pode dizer.
- Eu não tenho outro. Será que uma mulher não pode buscar sua felicidade sem alguém pensar que tem homem na jogada?
- Vamos, pode falar.
- Douglas, por favor...
- Vai, diz. Eu aguento.
- Tudo bem. Eu tenho outro.
- Droga. Eu sabia.
- Sabia?
- Não, não sabia. Foi só uma frase retórica.
- Ah, tá.
- Márcia, quem é esse safado?
- Isso importa?
- Claro que importa.
- Deixa pra lá.
- Não, fala. Agora eu quero saber.
- Você vai ficar bravo.
- Não, não vou.
- Douglas...
- Fala!
- Tá bom, tá bom. É o ...
- O?
- O... o...
- Vai, Márcia. Fala de uma vez. Diz logo o nome desse... Ah, não. Não me diga que...
- Sim. Ele mesmo.
- Eu não acredito.
- Tá vendo? É por isso que eu não queria contar pra você. Eu sabia que você ia ficar bravo.
- Bravo? Eu? Imagina. Eu estou super feliz.
- Não precisa ser irônico.
- Aquele filho-da-puta.
- Controle-se, Douglas.
- Me controlar? Você me conta uma coisa dessas e quer que eu me controle? Meu melhor amigo imaginário com a minha namorada imaginária... Muito bom. Agora eu sou o quê? Um corno imaginário?
- Não acha que está levando isso a sério demais? Afinal, esse chifre não existe. Está tudo na sua cabeça.
- Excelente sua piada, Márcia.
- Desculpe. Saiu sem querer. O que eu quis dizer é que... Bem, Douglas, esta situação é apenas uma criação da sua mente, não é mesmo?
- Não tem dessa. Um corno é um corno em qualquer circunstância. Inclusive no mundo da imaginação.
- Para de drama.
- Olha, o Homem-Edredon é o meu melhor amigo, meu primeiro amigo, eu conheço o Homem-Edredon desde... desde... desde nem sei quando. Você não pode ter um caso com o Homem-Edredon.
- Por que não? Nós também temos direito à felicidade.
- Mas o Homem-Edredon é o meu melhor amigo, porra.
- Ah, não vem com essa. Ultimamente você não estava nem aí pra ele, só dava atenção para o Capitão-Cerveja e o Major Controle-Remoto.
- Só pode ser de sacanagem. Tanto amigo imaginário por aí e você tinha que pegar justamente o Homem-Edredon? Por que logo ele, Márcia?
- Não sei. Na verdade, eu sou apenas um prolongamento da sua personalidade. Minhas ações são apenas manifestações dos seus desejos, conscientes ou não.
- Está dizendo que eu tenho tesão no Homem-Edredon? Então também está dizendo que eu sou gay? Além de corno, também sou gay?
- Escuta, Douglas, não dificulta as coisas pra mim.
- Dificultar pra você? Ah, tá. Eu perco a namorada para um edredon e as coisas estão difíceis pra você?
- Vai ser melhor assim. Agora você pode voltar pra realidade e ir atrás de uma mulher de verdade.
- Ah, Douglas, pelo amor de Deus...
- Tipo uns dois centímetros a mais, com umas veias mais pulsantes...
- Douglas!
- Porque se você disser que é isso, eu ponho uma prótese e...
- Douglas, isso não tem nada a ver com seu pau.
- Tem certeza?
- Tenho.
- Então por que tá me deixando?
- Não sei.
- Como não sabe? Uma decisão drástica dessas tem que ter, no mínimo, um bom motivo. Afinal, você está alterando irremediavelmente o curso futuro da nossa existência.
- Não exagera. Também não é pra isso tudo.
- Desculpe, mas é um choque muito grande pra mim.
- Ah, dá um tempo. Vai dizer que é a primeira vez que você é abandonado por uma namorada?
- Por uma namorada imaginária é a primeira vez sim. A gente cria uma namorada imaginária justamente para não ter esse tipo de problema. Sabe, eu criei você. Em tese, você não deveria sair do meu controle. Isso não devia estar acontecendo.
- Mas isso não está acontecendo. Na verdade, essa é uma conversa imaginária, uma representação alegórica, uma metáfora psíquica da sua virilidade frágil, da sua incapacidade para lidar com o sexo feminino, da sua impotência sexual latente e...
- Tá bom, tá bom. Eu não quis dizer acontecer no sentido literal. Quer dizer, eu achei que estivesse tudo bem com a gente e, de repente, você chega e diz que está tudo acabado. O que eu fiz de errado?
- Sei lá, nada. Acho que vivemos em mundos muito diferentes.
- Do que você está falando? Nós vivemos juntos na mesma casa.
- Você sabe do que eu estou falando. Eu nem conheço seus pais. E olha que eles também moram aqui.
- Márcia, você é minha namorada imaginária. O que acha que meus pais diriam se eu entrasse pela porta, apontasse um ponto vazio no espaço e dissesse: “oi, pessoal, essa é a Márcia, minha nova namorada”?
- Sempre a mesma desculpa. Você me trata como uma amante secreta.
- E o que você queria que eu fizesse?
- Queria que você não me visse apenas como um objeto. Queria que me desse mais espaço na sua vida.
- Mas, Márcia, você é minha vida.
- Douglas, a única coisa que eu preciso pra viver é de um pouco da sua capacidade de abstração e, como sua namorada imaginária, posso dizer com autoridade que você tem andado totalmente sem criatividade.
- Não acredito que estou ouvindo isso. Márcia, eu sempre fiz tudo pra te deixar feliz. Você queria restaurante francês, eu imaginei, queria casaco de vison, eu imaginei...
- Imaginou na cor errada.
-... queria um pônei, eu imaginei... Até aquela coisa estranha que você queria fazer... sabe, aquele lance com o melão...
- Hi, hi. Achei que você não ia topar. Deve ter doído bastante.
- Márcia, você tem tudo que toda mulher sempre sonhou. Você tem conforto, carinho, sexo de qualidade...
- Aham.
- O que foi? Olha, eu tive um probleminha ontem, mas foi a primeira vez e...
- Aham.
- Tudo bem, aquilo que aconteceu ontem vem acontecendo frequentemente. Mas é apenas uma fase.
- Aham.
- Ok, ok. Já entendi. Tenho andado um pouco... ahn... distraído. Mas você deveria concordar comigo que a grande vantagem da namorada imaginária é que a gente pode ter esses problemas sem que ela se estresse ou tenha vontade de procurar outro, ou... opa, opa. Peraí. Já entendi tudo.
- Entendeu o quê?
- Você tem outro.
- Não seja ridículo.
- Você tem outro. Pode dizer.
- Eu não tenho outro. Será que uma mulher não pode buscar sua felicidade sem alguém pensar que tem homem na jogada?
- Vamos, pode falar.
- Douglas, por favor...
- Vai, diz. Eu aguento.
- Tudo bem. Eu tenho outro.
- Droga. Eu sabia.
- Sabia?
- Não, não sabia. Foi só uma frase retórica.
- Ah, tá.
- Márcia, quem é esse safado?
- Isso importa?
- Claro que importa.
- Deixa pra lá.
- Não, fala. Agora eu quero saber.
- Você vai ficar bravo.
- Não, não vou.
- Douglas...
- Fala!
- Tá bom, tá bom. É o ...
- O?
- O... o...
- Vai, Márcia. Fala de uma vez. Diz logo o nome desse... Ah, não. Não me diga que...
- Sim. Ele mesmo.
- Eu não acredito.
- Tá vendo? É por isso que eu não queria contar pra você. Eu sabia que você ia ficar bravo.
- Bravo? Eu? Imagina. Eu estou super feliz.
- Não precisa ser irônico.
- Aquele filho-da-puta.
- Controle-se, Douglas.
- Me controlar? Você me conta uma coisa dessas e quer que eu me controle? Meu melhor amigo imaginário com a minha namorada imaginária... Muito bom. Agora eu sou o quê? Um corno imaginário?
- Não acha que está levando isso a sério demais? Afinal, esse chifre não existe. Está tudo na sua cabeça.
- Excelente sua piada, Márcia.
- Desculpe. Saiu sem querer. O que eu quis dizer é que... Bem, Douglas, esta situação é apenas uma criação da sua mente, não é mesmo?
- Não tem dessa. Um corno é um corno em qualquer circunstância. Inclusive no mundo da imaginação.
- Para de drama.
- Olha, o Homem-Edredon é o meu melhor amigo, meu primeiro amigo, eu conheço o Homem-Edredon desde... desde... desde nem sei quando. Você não pode ter um caso com o Homem-Edredon.
- Por que não? Nós também temos direito à felicidade.
- Mas o Homem-Edredon é o meu melhor amigo, porra.
- Ah, não vem com essa. Ultimamente você não estava nem aí pra ele, só dava atenção para o Capitão-Cerveja e o Major Controle-Remoto.
- Só pode ser de sacanagem. Tanto amigo imaginário por aí e você tinha que pegar justamente o Homem-Edredon? Por que logo ele, Márcia?
- Não sei. Na verdade, eu sou apenas um prolongamento da sua personalidade. Minhas ações são apenas manifestações dos seus desejos, conscientes ou não.
- Está dizendo que eu tenho tesão no Homem-Edredon? Então também está dizendo que eu sou gay? Além de corno, também sou gay?
- Escuta, Douglas, não dificulta as coisas pra mim.
- Dificultar pra você? Ah, tá. Eu perco a namorada para um edredon e as coisas estão difíceis pra você?
- Vai ser melhor assim. Agora você pode voltar pra realidade e ir atrás de uma mulher de verdade.
- Mas eu não quero uma mulher de verdade. Eu quero uma mulher gostosa mas que sinta tesão por mim, entende? Uma mulher compreensiva, que goste de futebol e que goze em dois minutos e doze segundos. Será que é pedir demais?
- Adeus, Douglas.
- Pode ir, pode ir. Espero que você seja muito feliz. Mas duvido que um edredon consiga imaginar uma viagem a Bariloche ou um anel de diamantes. E tem mais. Eu poderia dizer que o pênis do Homem-Edredon murcha quando você encosta, mas acho que você já sabe disso, não é? Ha, ha. Quero ver se ele consegue fazer o coqueirinho caribenho. Ha ha. Desculpa, Márcia, eu não quis dizer isso. É que eu estou meio nervoso. Por favor, volta, Márcia. Volta. Sua vadia.
- Adeus, Douglas.
- Pode ir, pode ir. Espero que você seja muito feliz. Mas duvido que um edredon consiga imaginar uma viagem a Bariloche ou um anel de diamantes. E tem mais. Eu poderia dizer que o pênis do Homem-Edredon murcha quando você encosta, mas acho que você já sabe disso, não é? Ha, ha. Quero ver se ele consegue fazer o coqueirinho caribenho. Ha ha. Desculpa, Márcia, eu não quis dizer isso. É que eu estou meio nervoso. Por favor, volta, Márcia. Volta. Sua vadia.